Para Anneke Vogt-Gärtner
Sonhava que a solitaria luz esquivasse o norte,
e que, irmanada com as nuvens, roubasse
qualquer reflexo, penumbra ou vergonha.
Sonhava braços longos de cegonhas.
Sonhava pernas longas das garças.
Sonhei não haver desgraça na tua sorte
e que a tua morte haja sido em paz.
Morte que se revelou, assim, tarde
E, embora não pudemos bem conhecer-nos,
Roubada cedo por enfermedade,
Sem remedos, sem escoras.
Dois anos, 17520 horas, mais
de um milhão de minutos!
É tempo demais porém diminuto
para esconder-te a verdade e a mentira.
E por mais que a nossa amizade no fundo não existira,
Foi de amizade, enfim, o brilho daqueles momentos.
Dei ao espelho o dom dos ventos.
Deixei passo aos cacos dos esquecimentos,
Caos de vida que nos rouba liberdades
e nos mostra tarde o fim de gentes queridas!
Que estranhos tempos os que vivemos:
saber das mortes pelas redes sem teias,
que não conectam nada, ninguém, nem lugar.
Apenas ecoam egos dos que não encontram
conforto em vidas propias e sonham as vidas alheias.
Que estranhos tempos, Deus meu!
Que me aparece a morte num festejo do seu nascimento,
congelada no tempo como um quilate.
Ou para sempre, enquanto houver eletricidade.
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