lunes, 21 de enero de 2008

Nadas

Nadas, sim. Nadas. Muitas vezes Nada. Mil vezes Nada. Nada de cuidado. Nada de carinho. Nada de respeito. Nada de humildade. E os outros 996 nadas para completar 1000.

Ele era assim: cara-de-pau. Dura. Fixa. Imutável. Brilhante. Encerada. Podiam passar um milhão de situações desagradáveis que ele permanecia ali: qual estátua. Imóvel. Sem presentar uma ruga de preocupação. Sembrante perfeito. Lúcido. Iluminado.

Tinha saído aquele dia com más intenções. Digo, más intenções como um pleonasmo já que pela sua cabeça não podia passar nada melhor. Andou ao longo da Marylibone Road como se caminhasse pelo calçadão de Copacabana. Camiseta do Manchester United, buscando algum pub para molhar a goela.

Parou. Olhou para um lado. Olhou para o outro, e desafiou. Pôs o pé direito no pavimento, mantendo o esquerdo na calçada. Um taxi parou. Ele perguntou, em um perfeito inglês, sem esboçar qualquer sentimento:

  • Voce está livre?

  • Sim, claro.

  • Então viva a Liberdade!!

O taxi disparou, silencioso, guardando o ódio em pleno exercício da delicadeza inglesa que era necesária no West Side. Ele gargalhou. E gargalhou tanto que sentia dor na barriga. Sózinho. Só. Mais ninguém. Ninguém podia entender aquele prazer. E seguiu.

Ele acabava de sair do Regent's Park. Caminhou pela Marylebone. Brincou com o taxista e, agora, estava parado na porta do Museu. O convite para virar estátua do Madame Tussauds lhe chegou em boa hora. Ensaiou a sua. Fazia frio. Ele, congelado.

Passou ali meia-hora. Duro. De cera. De madeira. Ganhou algumas moedas. Queria mais. Decidiu esticar o turno. Cinco horas já passavam. Quando estimou 10 libras parou. Se moveu, para a surpresa de todos. Se virou de frente para o museu. Fez um breve ademan e se despidiu do público. Foi para o Hyde Park para despotricar contra a Rainha. Depois gastou as 10 libras no primeiro pub que encontrou em Lancaster Gate.

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